sábado, 19 de junho de 2010

Margaridas - Rascunho Rejeitado



Ele estava acordado às 2h da manhã fitando o teto. Seu quarto era uma escuridão de contornos indefinidos que o engoliam e sufocavam, era silencioso e perturbador. Sua mente, em contraste, estava repleta de pensamentos que vinham em turbilhões, afastando o sono. A maioria era sobre ela, na verdade tudo girava em torno disso. Pôde facilmente imaginá-la ao seu lado, tocar sua pele ou cheirar seus cabelos. Mas não era real e ele acabou se cansando. Concentrou-se então nas lembranças. Curtas e distantes, sim, mas boas o suficiente para deixá-lo inebriado com o seu perfume, ainda escondido em alguma camiseta dentro do armário. Olhou o relógio. Ainda não haviam se passado 10 minutos desde a última vez que o consultara. O tempo parecia se arrastar na ausência dela, tornando a noite uma tortura e fazendo-o odiar cada estrela que iluminava o negro céu de agosto. Ás vezes ele chorava, quando se lembrava. Passava uma hora inteira soluçando e depois se esquecia de novo. Ele tinha acabado de toar consciência de que não adiantava contar os segundos até o amanhecer. Não era como se ele pudesse revê-la nos corredores no dia seguinte e não era a madrugada que os separava: era a eternidade. Ela estava morta e gelada, seus lábios perfeitos apodreciam debaixo da terra. A dor rasgou seu peito e ele não tentou sufocar o grito de terror. Era como um animal machucado, aquela ferida aberta ardia mais que uma queimadura. Uma parte dele havia sido arrancada. Desistiu de dormir. Pegou a camiseta no armário e a vestiu, quase desmaiando ao sentir o cheiro dela. Pulou a janela e caminhou até o cemitério pela rua deserta. Lá estava a lápide onde ela descansaria para sempre. Uma flor ainda fresca jazia sobre o túmulo. Ele a tomou nas mãos e se sentou. “Como se pudesse substituir sua beleza.” Pensou com amargura. “Como se uma margarida chegasse aos pés do que ela foi”. Deitou-se. Foi embalado pelo alívio da inconsciência, que o retirava do vento frio da noite e trazia campos verdes e morangos, como quando a conhecera. Sentiu o calor do sol e viu-se recostado na grama ao lado dela, rindo ao acaso, como se a vida fosse boa. Amanheceu morto, sem outro motivo que não o frio ou a vontade. Tivera sorte, nada jamais o levaria de seu sonho. Seria eterno, assim como o sorriso que sombreava seus lábios endurecidos.

Um comentário:

  1. Essa foi só a primeira versão que eu escrevi de margaridas...
    Não a considero muito porque não tem nem como continuar. Além disso ela me incomoda.
    A "Margaridas" de verdade é a próxima.É a que está sujeita a uma possível continuação.

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