quarta-feira, 1 de julho de 2015

Mauerbauertraurigkeit

O gosto do café não tomado voltou à minha boca hoje, um tanto quanto amargado pelas lágrimas de uma corujinha que descobri estimar muito. Consolei sua dor com as palavras mais verdadeiras possíveis e ela descansou sua cabeça nos meus ombros, pesados pela culpa de já ter desejado que esse dia um dia chegasse.
"Ainda bem que vou embora" é um pensamento que muito me ocorre ultimamente e por ele eu nutro uma adoração, dependência mesmo. É como se eu percebesse que meu barco está furado justamente ao avistar a costa de um continente estranho. Exceto, talvez, que é meu porto que afunda e é a um barco - pequeno, instável - que me jogarei quando a madeira podre dos decks ceder sob maus pés. Rumo ao desconhecido.
     O desejo de ver-me cercada de mar é também contade de ver desaparecer toda vivalma. Um querer de silêncio, um querer de que ninguém me pergunte nada ou me peça para decidir qualquer coisa. Sei que não vai ter café pra mim tão cedo, amargo ou doce. Sei que o cheiro de pipoca já foi-se todo janela afora. Sei que estou só e sei que quero, apesar da saudade que vai apertar, estar só e apartada das vozes e rostos que conheço.
     Quero ter a oportunidade de ser lida por olhos mais imparciais, ter o privilégio e o desafio de ser barco sem lenço, sem vela e sem documento: só um nome pintado no casco e vontade de navegar.
     Apesar das unhas bem aparadas, minhas garras têm saltado pra fora e arranhado o que me é mais caro. Preciso parar. Preciso ir-me embora antes que abram-se fendas grandes demais, sulcos que afeição nenhuma preenche. Preciso ir embora antes que toque mesmo fogo nesse apartamento, no meu cabelo, no tanque de gasolina do carro:
     Preciso dar o fora e preciso que ninguém venha comigo. Talvez nem eu.
   

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