"Um, dois, três, inspira." Contava Anne mentalmente. "Um, dois, três, expira." Apertou mais o casaco em volta do cortpo, tentando não tirar os olhs dos sapatos. A porta estava próxima, mais 4 metros e estaria segura. O tornozelo recém curado ainda latejava e sentia as grossas camadas de gelo que lhe cobriam a pouco mais que uma hora. Apenas dois passos e estaria dentro, dois passos! Um passo! Abre a porta, joga o corpo pra dentro, ah!
Ir do carro até a porta de casa era um suplício, tornozelo machucado ou não. Martin estacionava no pátio da frente e queles dez metros atapetados de grama eram sua ruina. Em todo e quaquer ambiente aberto a menina podia sentir o peso do céu sobre sí e toda a imensidão do ar à sua volta. Dava-lhe pânico sentir-se tão vulnerável, tão... Tão... Pequena.
"Estou em casa"Disse ela, esperando que fosse alto o suficiente. A mãe logo veio lhe ajudar a subir as escadas e perguntar sobre a consulta.
"Como foi? Doeu-lhe quando tiraram o gesso? O doutor disse em quanto tempo poderá andar normalmente?"Eram sempre perguntas demais, que Anne respondia pacientemente.
"O tornozelo ainda está dolorido, mas o médico acredita que em três dias já estarei subindo escadas e todo o resto." Explicou. " Agora vou me trocar. O vô e a avó já estão à espera, certo?" Haviam chegado à porta do quarto.
"Sim, querida." Replicou a mãe. "Vai-te logo que hoje conseguimos até manter Tab dentro de casa. O chá está servido!"
Anne entrou no cômodo e trancou a porta, rodando a chave duas vezes. Jogou-se de bruços na cama, exausta. Sair de casa extinguia todas as suas forças e ela o evitava ao máximo. Que belo par de filhas os pais tinham, pensou ela, quase amarga. A mais velha claustrofóbica e a mais nova que mal podia por os pés pela porta sem encolher-se como um rato. Tirou as pesadas botas, empurrando com os pés e ficou mirndo a segurança do teto por um tempo.
Finalmente tomou coragem para levantar. Foi até o seu pequeno lavablo e molhou o rosto com água fria. Olhou o próprio reflexo no espelhinho e soltou um muxoxo. Era um rostinho maltratado e infeliz que Anne quase não reconheceu como seu. Enxugou-se e pôs a maquiagem devida a uma donzela de 15 anos: a camada de pó de arroz que cobria as olheiras, pó de rouge claro para as maçãs e um rosa pálido nos lábios. Quando olhou-se novament o resultado agradou-a um pouco mais. "Talvez Alex olhasse para mim agora, talvez... Talvez." A menina afastou aquela esperança indign com um abano de cabeça.
Desamarrou o corpete com dedos calmos e desabotoou o vestido, jogando tudo no cesto de roupa suja. escolheu um vestido marrom, combinando com os cabelos que escorriam até o busto. Calçou uma bota ais leve que a de antes, mas ainda assim bem amarrada e justa no tornozelo. Jogou um casaco sobre os ombrs e uma borrifada de perfume sobre si. Sentindo-se melhor, destrancou porta e pôs-se a caminhar desajeitada pelo corredor, rumo à escada. A mãe tinha mandado que Gabi a esperasse ali no topo, para ajudar na descida. Anne deu-lhe uma mão e apoiou-se com a outra no corrimão e assim foram lentamente, degrau por degrau.
Ao chegar o térreo ela agradeceu a empregada e virou-se para a esquerda, dirigindo-se à sala de chá. Antes de chegar à porta já podia escutar as vozes da mãe e dos avós conversando e a risada animada de Tabitha. Como queria ser ao menos um pouco relazada como a irmã. "Tenho certeza de que conseguiria falar com Alex." Pensou, enquando arrastava os pés para dentro do recinto. "Quem sabe até lhe dar um abraço, um bom abraço.
A voz da mãe saudou-lhe, alta e e aguda. "Annie! Meu bem! Junte-se a nós, os biscoitos estão um pecado." Ofereceu a cestinha à filha uando esta se sentou, depois de beijar a mão da avó e receber a bênção do avô. Anne ceitou um biscoito e serviu-se do chá quente que repousava numa cheleira de porcelana no centro da mesinha baixa. Os avós estavam no sofá à sua frente, Tabitha, esparramada na cadeira à sua direita e a mãe tomava a poltrona à direita, enquanto Anne ocupava um dos assentos da marquesa acolchoada de carvalho.
A conversa estava agradável e o chá, doce. Tabitha remexia-se de quando em quando mas estava incrivelmente ocntrolada, considerando que as janelas estavam fechadas. Reparou que a irmã olhava para o jardim com certa frequência, mas pensou que era muito natural, vez que estavam dentro de casa a mais de uma hora. Anne sabia que o único cômodo em que Tab se sentia realmente confortavel era o seu quarto, cujas paredes eram, na verdade, grandes janelas de vidro que iam do teto ao rodapé e davam para a vista sensacional do bosque que rodeava o terreno da casa.
Discutiam acaloradamente sobre a obra de Edgar A. Poe quando Gabi chegou à porta e interrompeu delicadamente a conversa. "Senhora Margaret, chegou um recado para a senhora." Disse a moça, tirando um pequeno papel do avental. "Quem deixou aqui foi o senhor Desmond, aquele motorista dos Emmerich." Acrescentou, entregando a nota à patroa. O coração de Anne parou. Emmerich. Era da casa de Alex. Se fosse o que ela estava pensando... Inclinou-se para a direita, na esperança de fisgar alguma coisa enquanto a mãe passava os olhos pelo papel.
"Vejam que adorável!" Exclamou Margaret quando terminou de ler. "Os Emmerich convidam-nos para passar o dia em sua casa amanhã. Seria perfeito para que você pudesse conhecer seu filho mais velho, Pedro, Tabbie, querida. Quem sabe não gosta dele?" Anne sabia que a mãe sempre quis empurrar o menino para Tabitha. Ela e a senhora Emmerich sonhavam com esse casamento desde que as meninas eram pequenas. Anne tinha absoluta certeza de que Tab nunca se dobraria a esse desejo fútil da mãe, mas não estava interessada nisso, queria saber de si própria e onde ficava nessa história.
"E quanto a mim, mãe? Também posso ir?" Inquiriu.
"Óbvio que sim, benzinho. Creio que a companhia de Pedro seja um tanto quanto desinteressante pra você, vez que ele é bem mais velho, mas Alex certamente poderia lhe mostrar seu quarto. Tenho certeza de que vocês se divertiriam brincando ou pintando. Alex também não toma aulas de desenho com seu professor?"
"Sim." Murmurou a menina, tentando conter a felicidade. Mal ouvia os resmungos de Tabitha. Aquilo era bom demais pra se verdade. Um dia inteiro, só ela e Alex? Pensou que ia explodir, mas continuou sentada, assistindo a briga selvagem da mãe e da irmã.
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