Olhe por outro lado. Cruze a ponte até a feira. Compre uma maçã caramelada e de três pulinhos enquanto solta gritinhos. Porque você pode comer aquilo, sem se preocupar com os dentes ou com o valor calórico. Fique passeando por entre as lojas, pelo simples prazer de poder estar ao lado de pessoas sem precisar de fato lidar com elas ou entende-las . Volte pela ponte e, sem hesitar, pule no laguinho. De roupa e tudo. Grite bem alto. Diga UHU! Como quando você tinha dez anos e via filmes de luta onde todos faziam muito barulho.
Volte pra floresta. Corra entre as árvores, fingindo que é mais veloz que todo o mundo. Deixe os espinhos cravarem nos seus pés e nem ligue. Veja fadas. Siga-as até suas casas e tome chá com elas. Fale com as bruxas e bole planos malignos com elas. Envenene aquela princesa besta das histórias fuleiras dos livros de cinco reais. Ponha um pouco de verdade na sopa dela. Sorria ao vê-la morrer lentamente.
Pule corda com os filhos dos lenhadores. Aceite ir lanchar na casa deles. Vá pra ponte de novo. Pare na metade. Suba no parapeito e fique andando de um lado ao outro lá e cima. Cante uma canção junto com o ceguinho da vitrola. Faça as pedras quicarem no rio mais de três vezes. Sente no banco da praça com um sanduíche de queijo e fique lá comendo e olhando as pessoas passarem, imaginando os problemas na cabeça delas.
Vista o casaco quando ficar frio. Pule numa poça só pra molhar os sapatos da perua que passou com um poodle na bolsa. Saia correndo quando ela brigar com você. Compre um peixinho dourado na loja de animais e jogue ele no rio. Mesmo sabendo que ele vai morrer sem saber procurar comida sozinho. Só pra ele sentir a textura de um rio de verdade nas escamas. Só pra ele não passar o resto da vida em um aquário de água artificial. Só para ele viver de verdade, mesmo que viva menos. Porque, olhando por esse lado, soa muito melhor.
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