sexta-feira, 13 de novembro de 2015

Qué sé yo - 18/10/15

Vivo em dois lugares ao mesmo tempo. Ambos estão em um dos futuros dos "Mundos Possíveis" dos inúmeros universos do porvir. E se criar um mundo possível me é tão fácil... Que significa isso? É a minha realidade, LA CONCHA! Sim, é a minha concha, e por isso é tão natural.
Começo com uma ilusão. Onde está minha vida? Afinal, realidade é só uma escolha... Qual visão você prefere? Qual sente mais real nesse seu corpo passageiro? Porque vai passar, vai passar, vai passar.
Y está mal esta coisa de me sentir mais morocha, mais índia, mais vira-lata e mais orgulhosa por isso? Claro que não. Quanto mais sinto que não pertenezco acá, mais me dou conta de que um não pertence a um lugar, senão a si mesmo. Ao que deseja. Lugares são espaços físicos, portanto, percebidos. Se percebidos são, por tal tanto, imaginários.
Ai, obrigada, imaginación. Não digo grata, nem "gracias", mas sim repito o OBRIGADA. Para assistir e sentir-se parte de alguma coisa, hay que aceptar las reglas desse "Mundo Possível", que não é um, senão vários, mas hay que elegir.
Qual escolher, então? Se um é o deondeeuvenho e todos os outros são potencialmente o praondeeuvou? E se não tenho libido, será isso por não poder esquecer ou por não assimilar o diferente? Ou por não conhecer quizás, o suficiente? (ou o quizás, suficientemente -y yo que sé).
Rimo sem perceber, anseio por escrever o que nem sei que precessito colocar pra fora (pra dentro). E o que dizer? Quais palavras desenhar com tinta na superfície?
Se continuo me enamorando e tão facilmente caindo... Porque caímos quando percebemos e percebemos quando atingimos o fundo. Então talvez não possa me dar ao luxo de gastar energia tentando. Só por inspiração? Pelo fervor-friozinho que da na concha. Nessa, na outra... Dizem que as felizes não fazem pérola. (y que sé yo)
Mas mais me vale dois colares voando do que um no pescoço enforcado. As bolinhas marcando em baixo-relevo. Deixe queto, que cada maré quem faz é uma lua diferente e nada nada o único mundo possível é o desse. segundo. que. agora. tá. passando. não. merda. escapou. de novo. agora. ah. ah. ah. ah. ah. ah. huuum. aaaah. aaaaaaaaaaaah. hummmmm. aaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaah. Gozei.


quinta-feira, 5 de novembro de 2015

Como Um Chuchu

É uma das cordas bambas mais perigosas do mundo esta na qual brinca o rato. É feita de trança delicada de malha de metais incandescentes. Dói um pouco caminhar sobre ela, mas os pés já anestesiados da queimadura contínua não reclamam tanto. Novas bolhas vão surgindo por cima das marcas dos antigos calos, já quase cicatrizados.
Mas nem o pé nem as peles mortas são mais feios do que aquilo que se encontra no fundo do abismo que a corda cruza. O rato nem olha pra baixo por já saber de cor o que a escuridão e os quilômetros de profundidade encobrem. As imagens que busca ao avançar cada passo, essas sim pensa ter esquecido. Enxerga-as de relance quando sente as ferroadas dos metais em brasa, e é só o que pode ter delas se quiser evitar o tão temido desequilibrar.
Por que se arrisca, então? Talvez por tédio, pura e simplesmente. Pode ser que a avidez do deserto de areia, seguro, pastel, sólido(?), lo assuste mais que toda a dor que advém do possível cair da corda bamba. Esse fundo de poço, ao menos, já lhe é familiar. O esgoto... Já é trash por excelência, verdad?
Mas o deserto? Ai! O medo da sede que lhe implica... Só com muitos queijos (e vinhos) pra temperar. E a monotonia! Não lembre da monotonia, e da monocromia, e da tão temida (apesar de um pouco invejável) apatia. As lágrimas aí evaporam antes de saírem dos olhos, o coração bate sem vontade, bate por bater, na tentativa de escapar do lagarto frio que é a insônia.
E não há opção além de deserto, corda bamba e abismo? Não tem certeza se o conhece. Resta-lhe algumas lembranças em sépia de alguma praia cheia de coqueiros e peixes e vendedores de queijinho. Mas não tem certeza... Pode ter sido só um sonho. Já não tem certeza de muitas coisas, ultimamente. As imagens se borram, as cores se apagam, os cenários se confundem tanto que o brilho de uma cada bulba lhe chega quase como um farol. Um farol que queima e ameaça afoga-la, sim, mas ainda um farol.
"Mais forte...". Um arrepio corre uma espinha imaginada, lembrada. Os pelos do cangote real ameaçam eriçar. Os dedos lhes buscam, como que para certificar-se de que não se moveram. Olha pra trás, para a margem. Conta, mede, sim. Ainda está numa distância segura, só não sabe se acerta o caminho de volta, e nem ao menos se quer voltar. O rato sem graça se identifica com a pastelice do dia abobrinha que se vai com o sol. Abobrinha porque não teve sabor, como um chuchu, mas sem o som carinhoso do nome.

segunda-feira, 2 de novembro de 2015

Tentativa 40 - 23/10/15

Está o cientista em seu laboratório de janelas duas, agora cerradas, e a escuridão é total. Acende uma lamparina azul e a maneira como a luz toca livianamente seus objetos estranhos e sombrios. Revela formas parciais, dando espaço à escuridão. É quase como se não quisesse tocas os frascos de vidro e os fótons, todo o seu potencial luminoso, tratam de não o ser e não molestar as superfícies disformes do lugar.
O cientista admira, paralisado, a visão de seu laboratório banhado naquela luz. Sente-se em uma cidade à noite. A sensação das ruas frias sob seus pés lhe causa um arrepio. É lindo e solitário. Desfruta da solitude e do silêncio absoluto por alguns instantes. De a pouco vai perdendo a noção do espaço. As formas bordeadas de azul celeste já lhe parecem ondas eletromagnéticas no vácuo.
Pensa escutar um ruído. Bah, deseja. Deseja escutar alguma coisa, como que para certificar-se de que o silêncio advém de fora e não de dentro, de uma súbida surdez que tornaria a vida insuportável. Numa cidade à noite o ar seria frio à pele e a secura lhe castigaria a cara... Mas haveria o vento, os malditos automóveis, um mendigo, algum bendito som!
Coça o catarro da garganta. Pigarro. Será que sua solitude se transforma em solidão? Mas é um cientista! As pessoas, o barulho... Isso atrapalha os estudos, por isso buscava a calma. Mas que era mesmo que buscava? A dizer... Com seus estudos. Qual era o objeto de pesquisa que valia o preço da solidão? Alí só se via objetos disformes, contornos.
Escuta uma catraca de bicicleta do lado de fora. Pensa escutar. Escuta? Pensa nela. Mas ela nem nunca andava de bicicleta! O cérebro encontrou foi um atalho atrevido e malposto para ter a desculpa de sua imagem projetada na parede do laboratório. Será que a visão doeria? Estaría alí afora? Sente o impulso de abrir as janelas, mas resiste. Ela poderia estar aí a dois metros, um metro, a mera espessura da parede (quanto mediria, deus?). Andando numa bicicleta vermelha, assobiando com óculos escuros uma melodia tranquila.
Sim... Tranquila, mas melodia, ainda assim. O silêncio do laboratório lhe parece desolador comparado com sua suavidade. A luz azul se punha asquerosa a seus sentidos quando contrastado com o vermelho da bicicleta imaginária. Como deslizava! Mais fluidamente que as lágrimas duras que brotavam e escorriam por seu rosto.
Chuva. Cai do lado de fora e bate na janela, quebrando o silêncio de morte que antes lhe ensurdecia. Salva-lhe da loucura, a chuva. As gotas lavaram os vidros sujos da janela. Agora podia respirar, agora lhe ocorria que o que lhe faltava era o estudo, o objeto de estudo.
Senta-se na escrivaninha, põe as luvas. Tira da gaveta uma carpeta de arquivos velhos, empoeirada. Coloca em frente de si e, mãos enluvadas sobre o papel-madeira, hesita. Hesita de medo. Hesita porque não tem certeza se a luz azul antes inflama ou esfria as substâncias que aí estão guardadas, impressas em papel.
Por fim, tiralas do envelope, cuidando para não tocarlas com a pele. Põe-se tenso. Agarra um frasco com substâncias vaporosas e, com um conta-gotas, sorve daí um pouco do seu conteúdo. Mira o conta-gotas. Dentro do vidro há um líquido transparente, agora azulado pela luz do laboratório, que um facilmente trocaria por água mineral.
Mas não. O líquido era feito de uma substância muito mais perigosa, destilada por ele mesmo das glândulas de um animal ferido em seu íntimo. Apoia o braço na mesa, as mãos tremem. Não quer errar a medida exata e destruir o laboratório na explosão. Además, não sabe qual reação ocorrerá. É um pensador empírico, o que procura não está nos livros e a metolodogia não está estabelecida.
"Gravando". Aperta o botão do dispostivo de registro. Diz data e hora estrelares, estado de espírito, umidade do ar, condições de temperatura e pressão. Muita.
Afinal, aperta com cuidado o conta-gotas. Um fiapo de substância cintila pelo ar e em milissegundos cobre a curta distância entre mão e papel. O impacto quebra a tensão superficial do líquido (mas, repare, não a tensão profunda do cientista) e este se esparrama pela sua superfície.
Por um momento nada ocorre. Correm alguns segundos e alguns jatos de sangue pelas veias do seu corpo, bombeadas pelos ventrículos potentes. Lentamente a substância no papel começa a liquefazer-se, como se fosse tinta reagindo a solvente. Tremula. O cientista fica sem reação. O cérebro, fascinado com o efeito, não quer dar ordens às mãos para que interrompam o processo. De golpe, o coração toma controle e, num pulso firme, exige atitude responsiva. Pega o papel e enxuga dele a substância. As linhas da imagem estão distorcidas, mas, com algum esforço, distinguíveis.
O cientista suspira, meio assustado, meio aliviado. Ainda não estava preparado pra esquecer.
"Fim de Tentativa 40". Desliga o dispositivo de registro e guarda os equipamentos. Lança um último olhar a seu laboratório... A luz azul lhe parece conferir um tom perigoso, fantasmagórico a tudo. Dega-a e esfrega os olhos cansados. Não tem condições de continuar os estudos, muito menos condições normais de temperatura e pressão.
Queda em silêncio por alguns momentos e percebe a falta de chuva. Por aí que devem ter secado as nuvens, afinal. Abre as janelas: é de manhã. Será um lindo dia.

domingo, 1 de novembro de 2015

Estação Chacarita - 19/08/15

Como Karenina, espero insone a passagem do trem. Dentro das pálpebras cerradas os olhos estão bem abertos e as pupilas, dilatadas. Antecipa o tremor dos trilhos muito antes que chegue de fato a tamborilar na minha pele. Os ouvidos escutam seu cíclico tranquear metálico - mecânico antes que seja fisicamente audível para estes tímpanos Arkadievnos.


Já não sei se mais anseio por eles ou temo sua chegada. Já não sei se são causa de minha insônia ou canção de ninar que me embala a insônia noite adentro. Talvez o único sono que possam oferecer-me seja o dos sonhos dos trilhos de trem - dos quais, sabemos, não se pode mais acordar.
Anna dorme. Dentro das pálpebras cerradas os olhos abertos choram. A música é linda.