sexta-feira, 4 de maio de 2012

Inconscientemente Cherry

   Bom, eu não queria dizer... Meio constrangedor, entende? Mas você sabe. No fundo do cérebro, na lembrança de um pesadelo esquisito da infância, você sabe muito bem. Ela existe lá dentro; talvez entre duas costelas ou, quem sabe, na ponta do dedo do meio.
   É uma coisinha minúscula, gelada, que arranha a parede dos ossos com pequenas unhas de mármore branco. É um barulhinho, uma correntinha de ouro roçando no fundo da piscina. Simplesmente desesperador. Como aquela vozinha aguda de passarinho que só se escuta pelo canto das orelhas, a uns 87 graus, mais ou menos. Você lembra desse sonho. É certo, como o dia depois da noite, que o pio de canarinho engrossa e se torna uma voz grave e macia que vai te devorar e quebrar sua alma em duas.
   A coisinha também vai partir seu espírito. Ela é como o sonho, mas continua lá, PRINCIPALMENTE quando você acorda. Ela vai descascando seus ossos e furando seus pulmões com as unhas postiças de mármore e vai derreter toda a gentileza com sua saliva ácida que cai, gota a gota, no pequeno jardim de jasmin que você trancou no armário da memória.
   Ah, coisinha odiosa! Você também tem uma? Ela é do tamanho de uma aranhazinha; menos que uma viúva negra, mas tão letal quanto. Talvez mais. Tece sua teia pelas minhas vísceras, põe uma lente de aumento nas vizarrices dos meus pesadelos mais obscuros e torna meus melhores desejos realidade, só em sonhos, para que eu queira morrer toda vez que acordo.(Não nade de costas. Só não nade de costas!)
   Ela mesma se odeia, a coisinha. Me grita por entorpecentes, mas não há nada que eu possa lhe dar que seja mais venenoso que seu póroprio néctar vermelho, sua calda de cereja. Oh, Cherry, Cherry... É como estou pensando em chamá-la, a minha pequena, minha criaturinha feita de sete pecados capitais e pó. Porque é ao pó que todos voltamos todas as noites. 
   Sonhe com flores, sonhe com borboletas. Boa noite, gatinho.

















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